O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
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De todas as etapas do desenvolvimento das plantas, a fase de muda é a mais sensível ao veranico. Com o calor, a seca e o sistema radicular pouco desenvolvido, incapaz de repor a água perdida pelas folhas, os estômatos, estruturas presentes na face abaxial das folhas do café (responsáveis pela entrada de CO2 e saída de O2 e água) se fecham interrompendo o fluxo de água no sistema solo-planta-atmosfera. Nessa nova condição, as plantas deixam de absorver água e minerais do solo, murcham, queimam e, em casos extremos, secam e morrem.
Hoje, mais do que nunca, a qualidade do plantio está ameaçada por constantes veranicos, que obrigam o uso da irrigação e, em condição de sequeiro, a reposição de grande quantidade de mudas para substituir aquelas que estão mortas e as que foram mais afetadas. Não obstante o stand esteja completado, existe a dúvida se as mudas que passaram por esse estresse e que não foram substituídas irão apresentar sequelas que, a longo prazo, comprometerão a produção e a longevidade da lavoura. Até onde sei, não existem na literatura cafeeira pesquisas que possam responder com segurança esse questionamento. O que existem são dezenas de estudos que mostram os efeitos imediatos do déficit hídrico em mudas e todas as conclusões, como não podiam ser diferentes, corroboram prejuízos no curto prazo ao se comparar com a testemunha irrigada.
Apesar da carência de investigações científicas a longo prazo, existem alguns estudos mostrando que ciclos alternados de irrigação e seca em mudas de café no viveiro condicionam às plantas a reagirem mais rápida e favoravelmente durante os próximos eventos de estresse. Os autores sugerem que múltiplos ciclos de déficit hídrico e irrigação, quando aplicados prematuramente na fase de muda, tornam as plantas mais resilientes e as preparam para que tenham melhor desempenho diante de novas situações de seca. Adaptações estruturais morfo-anatômicas e na maquinaria fisiológica bioquímica e molecular, denominadas de rustificação, são responsáveis por tornar as plantas jovens que passaram por carência de água mais adaptadas à seca do que aquelas que não passaram por isso.
Esses estudos oferecem importantes pistas sobre as vantagens a longo prazo das mudas de café passarem por episódios de seca moderada frente às permanentemente irrigadas. De certa forma, ao se fazer a aclimatação das mudas no viveiro dias antes do plantio, elas já passam por esse processo de “endurecimento”, que as condiciona à altas radiações e ciclos de calor e seca; ambiente esse que brevemente estarão expostas quando estiverem no campo. De fato, é comum observar que nas horas mais quentes do dia cafés recém-plantados murchem suas folhas e, na manhã seguinte, recuperem a turgescência por completo e sigam normalmente o seu curso de desenvolvimento. Enquanto a recuperação da turgescência no “predawn” estiver ocorrendo significa que: (i) há água disponível no solo, (ii) as raízes estão conseguindo absorvê-la, (iii) o sistema de transporte raiz-parte aérea está ativo e (iv) os mecanismos estomáticos estão funcionado normalmente e o cafeicultor não tem com o que se preocupar, apenas ficar de olho e monitorar a planta (análise visual), solo (tensiômetro) e clima (balanço hídrico).
É importante destacar que a melhora na performance das plantas à seca varia com o tempo de exposição e intensidade do estresse. No caso de cafés recém-plantados que passaram por veranico severo e prolongado (e que não foram substituídos), há grandes chances de sofrerem danos permanentes que se expressam em plantas isoladas distribuídas aleatoriamente no talhão ou em reboleiras. As anormalidades mais comuns visíveis a olho nu são: parte aérea pouco desenvolvida, enfezada, caule e ramos finos, internódios curtos, folhas pequenas e cloróticas. As raízes são poucas e superficiais, normalmente enoveladas, bifurcadas e tortuosas. Em condições normais, essas plantas dificilmente respondem às adubações e outros tratos culturais e, nessa condição, não morrem, mas também não se desenvolvem satisfatoriamente e estão fadadas a produzir muito pouco, além de serem as primeiras a amarelar, murchar, queimar e possivelmente morrer em secas futuras.
“Precisamos rever nossos conceitos de plantio de café. Antigamente, dava para plantar com um menor aporte de fertilizantes, sem uso de gel e com mudas de qualidade inferior, mas hoje não podemos arriscar. A intencionalidade do cafeicultor somada a um bom planejamento técnico tornou-se fundamental para o sucesso da implantação da lavoura. Sugiro aos cafeicultores que façam o replantio das plantas fracas que ficaram mais castigadas e com desenvolvimento comprometido. Já as demais, que passaram por esse verdadeiro teste de fogo, são vitoriosas e terão grande futuro”, disse Guy.
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
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