O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
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A sensação que tenho, após dois anos de intensos reveses climáticos na cafeicultura, é que estamos vivenciando dias de calmaria no campo. Desde outubro as chuvas voltaram; no início de janeiro, passamos por um período de precipitações volumosas que chegaram a preocupar, mas não se configuraram como estresse hídrico marcante e os famosos veranicos que normalmente ocorrem em janeiro e fevereiro não apareceram. O último Boletim de Avisos Fitossanitários (e climáticos) do Procafé, destacou que “não há déficit hídrico nas lavouras das regiões do Sul de Minas, do Triângulo Mineiro / Alto Paranaíba e da Mogiana - SP. Pelo contrário, configuram-se excedentes hídricos consideráveis e as temperaturas médias do ar ficaram abaixo das médias históricas em janeiro”.
Com o clima favorável e a retomada dos tratos culturais, os ramos dos cafeeiros continuaram a crescer em taxas superiores àquelas esperadas para o período, e com o enfolhamento ativo as lavouras recuperaram sua área foliar. Com as folhas jovens se desenvolvendo mais rápido, as folhas agora maduras (fonte) atingiram mais precocemente sua funcionalidade e passaram a produzir reservas de carboidratos que geraram excedentes de energia, cruciais para uma boa granação do fruto (dreno). Vários consultores relatam que os frutos estão bem formados e com a casca fina. Com isso as sementes estão aumentando em tamanho e peso, o que irá refletir em uma melhor renda do café a ser colhido este ano.
Todavia, um aumento expressivo na produção só deve ser esperado quando ocorrerem, significativamente: (i) aumento do número de ramos plagiotrópicos; (ii) aumento do número de nós; (iii) aumento do número de frutos em cada nó e (iv) aumento do peso e do tamanho da semente. Entretanto, convém esclarecer que a contribuição ou o peso de cada um desses quatro componentes para o aumento da produção, não gira em torno de 25%. Melhorias no peso das sementes do café por exemplo, obviamente contribuem para aumentar a produção, mas em uma escala bem menor, variando de 10 a 15%.
Olhando por outro ângulo, considerando que os três primeiros componentes da equação foram fortemente afetados pelas péssimas condições climáticas, é lícito considerar que a produção desse ano não deva sofrer aumento em relação à do ano passado. Muitos analistas consideram até mesmo, que deve haver uma queda na quantidade de café a ser produzido. Entretanto, não se deve desprezar a resiliência do cafeeiro, em resposta à melhoria do clima e do efeito residual da bienalidade que deveria passar de negativa para positiva. Portanto, por conta do quarto componente (tamanho e peso da semente) é possível haver um pequeno aumento na produção, masb, proporcional às forças da fonte e do dreno.
Nessa altura, o leitor desse artigo deve estar se indagando: se o clima no ano passado foi tão ruim para cafeicultura, por que não vai refletir em queda na produção deste ano? Não podemos esquecer que, dado a bienalidade da cultura do café, o volume da produção anterior tende a influenciar o da próxima. Daí, seria sensato, comparar os anos, segundo sua bienalidade (se negativa ou positiva). Portanto, mesmo que as forças da fonte e do dreno levem a um pequeno aumento da produção este ano, se compararmos essa perspectiva de safra, com a que foi colhida no último ano de bienalidade positiva (48,74 milhões de sacas - CONAB 2020), a produção do café arábica deverá ser cerca de 1/3 menor do que a potencialmente esperada para um ano par, caso houvesse uma safra cheia. Esse raciocínio foi o que me levou a considerar que o ciclo de baixa e alta produção deve ser quebrado e teremos dois anos consecutivos de safra baixa, 2021 e 2022.
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
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