O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
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Costumo dizer que a planta de café é um vegetal sensacional biologicamente falando, pois os cafés da espécie Coffea arábica apresentam uma sucessão de fases vegetativas e reprodutivas que ocorrem em aproximadamente 2 anos, uma paralela à outra. Essa atividade é diferente da maioria dos vegetais, que emitem as inflorescências na primavera e frutificam no mesmo ano fenológico (CAMARGO; CAMARGO, 2001).
Camargo (2001) criou um modelo bem didático exemplificando a dinâmica vegetativa e reprodutiva do cafeeiro: de setembro a março, a planta tem sua energia voltada em adquirir parte vegetativa e formar gemas vegetativas; de abril a agosto, sua energia está focada em indução, crescimento e dormência de gemas florais. Concomitantemente, de setembro a dezembro se tem a florada, pegamento do grão “chumbinho” e expansão dos frutos; de janeiro a março ocorre a granação dos frutos; de abril a junho a maturação dos grãos; e de julho a agosto, está em repouso e senescência dos ramos.
Figura 1: Vegetação e frutificação do cafeeiro arábica abrangendo seis fases fenológicas durante 24 meses.
A fenologia do cafeeiro arábica tem seu modelo com base nas condições agrometeorologicas do Brasil de forma anual. Esse modelo permite a identificação de quais fases são mais exigentes em água, facilmente disponível no solo, e as que necessitam da ocorrência de intempéries para o condicionamento uma florada abundante.
Com base na dinâmica global do cafeeiro, podemos otimizar a irrigação. Ao iniciar-se a florada, após um aumento do potencial hídrico nas gemas florais maduras, acontece um “choque hídrico”, levando a uma floração indefinida (vide vídeo - Excesso de água no cafeeiro) Segundo RENA e MAESTRI (1985), para uma florada mais uniforme, o cafeeiro deve passar por um período de restrição hídrica seguido de chuva ou irrigação constante. Alta temperatura associada a uma seca severa no início da florada provoca a morte dos tubos polínicos pelo processo de desidratação, ocasionando o abortamento das flores, o que resulta nas conhecidas “estrelinhas”.
Após a fecundação, vêm os chumbinhos e a expansão dos frutos. Essa etapa compreende os meses de setembro a dezembro. Havendo estiagem forte nessa fase, o estresse hídrico poderá prejudicar o crescimento dos frutos e resultar na ocorrência de peneira baixa. Nessa fase é muito importante que a parte hídrica do cafeeiro esteja em sua capacidade máxima. Os frutos expandem através da teoria da auxina: elas atuam nos genes das células vegetais, estimulando a síntese de enzimas que promovem o amolecimento da parede celular, possibilitando a distensão das células, que se alongam de acordo com a entrada de água.
A fase de granação dos frutos, geralmente nos meses de janeiro, é caracterizada pela solidificação dos líquidos internos, levando a formação dos grãos (vide conteúdo publicado no site pelo Professor José Donizeti Alves - Granação do café). Seca severa nessa fase leva o aparecimento de grãos chochos.
A maturação dos grãos acontece nos meses de abril, maio e junho. Nessa etapa, a evapotranspiração potencial decresce de forma significativa e as deficiências hídricas moderadas levam ao benefício da qualidade do produto.
De fato, para o cafeeiro, os períodos críticos de deficiência hídrica são os de floração e frutificação até, aproximadamente, a décima oitava semana após a floração, quando as limitações hídricas podem comprometer a produtividade (BONOMO et al., 2008). A utilização de práticas de conservação da umidade do solo ou de irrigação podem ser formas de mitigar os problemas de deficiência hídrica e de incrementos à produção. A irrigação favorece significativamente o desenvolvimento vegetativo e a produtividade do cafeeiro (Coffea arabica L.) (SCALCO et al., 2011).
A irrigação da lavoura cafeeira proporciona maior produtividade anual de café arábica beneficiado em relação à lavoura não irrigada. As irrigações devem se concentrar em duas fases fenológicas importantes para o cafeeiro: florescimento (94,5 mm), no mês de setembro, e maturação (67 mm), no mês de outubro (TOSSANI et al., 2019). A irrigação nas fases fenológicas descritas leva à maior produtividade, rendimento, peneira alta e menos grãos mocas.
Fonte:
BONOMO, R.; OLIVEIRA, L. F. C.; NETO, A. N. S.; BONOMO, P. Produtividade de cafeeiros arábica irrigados no cerrado goiano. Pesquisa Agropecuária Tropical, v. 38, n. 4, p. 233-240, out./dez. 2008.
CAMARGO, A. P.; CAMARGO, M. B. P. Definição e esquematização das fases fenológicas do cafeeiro arábica nas condições tropicais do Brasil. Bragantia, v. 60, n. 1, 65-68, 2001.
TOSSANI, F. C.; SANTINI, P. T.; FILHO, G. C. R.; MENDONÇA, J. M. A. Influência da irrigação na densidade e produtividade de Coffea arabica L. (cv Acaiá). X Simpósio de Pesquisa dos Cafés do Brasil – ISSN: 1984-9249 8 a 11 de outubro de 2019, Vitória – ES.
RENA, A. B.; MAESTRI, M. Fisiologia do cafeeiro. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.11, n.126, p.26-40, 1985.
SCALCO, M.S.; ALVARENGA, L.A.; GUIMARÃES, R.J.; COLOMBO, A.; ASSIS, G.A. Cultivo irrigado e não irrigado do cafeeiro (Coffea arabica L.) em plantio superadensado. Coffee Science, v.6, p.193-202, 2011.
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
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