O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
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Sabemos que, no inverno, a probabilidade de geada é um fato que assombra muito cafeeiros desde os primórdios, isso porque é um fenômeno natural que pode levar as plantas de café à morte e a perda de toda produção do ano seguinte.
Há muito tempo não geava com tamanha intensidade e alguns acreditavam que estávamos livres desse fenômeno por conta das mudanças climáticas, porém esse ano ela veio muito forte. Ainda que tardio, para tentar minimizar danos causados pela geada, precisamos saber o que é e como acontece.
A geada é um fenômeno climático que ocorre quando a temperatura atinge 0° em campo. O processo se dá com o congelamento do orvalho e a contínua queda da temperatura, em que o vapor d'água do ar em contato com a superfície fria passa diretamente para o estado sólido, depositando-se sobre as superfícies e levando a um aspecto esbranquiçado sobre a paisagem. Agronomicamente falando, esse fenômeno está associado com perdas e danos. A planta de café é sensível a geada, assim como as demais culturas, e essa sensibilidade está relacionada com o rompimento da parede celular. O frio que antecede o congelamento já causa um retardamento no crescimento da planta e as bordas das folhas novas amarelecem, levando a um escurecimento. Quando a geada atinge a planta, as partes de contato adquirem uma coloração escura, com aspecto de queima. Para o café, temperaturas nas folhas entre - 3°C e - 4°C matam os tecidos através de um processo físico-químico, sendo uma temperatura letal com congelamento da solução extracelular, ocasionando desequilíbrio do potencial químico da água na solução intra em relação à solução extracelular, o que gera um fluxo contínuo da solução intra para a extracelular, matando a célula. No tronco, pode ocorrer a morte a partir de - 2°C. Como sinais resultantes desse processo temos a desidratação das células, perda do potencial de turgescência, redução do volume celular e ruptura da membrana plasmática. Como aspectos visuais nota-se na folha flacidez e coloração verde escura, passando a ficar seca com o tempo (coloração palha em algumas plantas e marrom em outras), já no caule há vasos condutores necrosados (escuros) e nos frutos danos generalizados interna e externamente.
A geada pode atingir apenas as partes externas da planta (geada de capote), o tronco em lavouras de até 1,5 anos (canela de geada) ou ainda queimar a planta como um todo. Os pontos da planta atingidos são caracterizados por grande formação de brotações (palmeamento) (MATIELLO, et al, 2016). Existe ainda a geada branca, que se dá pelo congelamento do orvalho e deposição na superfície do material vegetal devido a condensação do vapor de água atmosférico, podendo ser irreversível. A geada negra se dá quando a temperatura de congelamento do ar é menor do que a temperatura de congelamento da planta, ou seja, a umidade do ar está alta. Em contrapartida, condições em que a umidade do ar está baixa (o ar do ambiente está seco), o frio é capaz de congelar a seiva da planta antes mesmo de formar cristais de gelo na superfície vegetal.
Na tentativa de mitigar os danos da geada no cafeeiro existem algumas estratégias de escape de danos. A primeira delas sempre é a recomendação de implantar lavouras em áreas conhecidas, sem incidência de geada, com histórico de pelos menos quatro anos sem a ocorrência desse fenômeno.
Na impossibilidade de ter uma área sem ocorrência de geada, deve-se optar por propriedades com declividade superior a 5%. Dar preferência às que recebem mais calor durante o inverno e são protegidas dos ventos frios. A irrigação pode ser uma alternativa que visa adicionar calor e ao mesmo tempo impedir a queda da temperatura abaixo de 0° C. Deve ser iniciada quando a temperatura ao nível dos canteiros ainda estiver acima de 0° C e não pode ser interrompida até o nascer do sol, sob pena de ocorrerem danos mais intensos. É importante ressaltar que essa estratégia é válida para ambiente controlado, como viveiro de mudas, e impraticável em nível de lavoura mesmo com pivot central, pois ele protegeria apenas a faixa irrigada no momento. Em talhões de pequeno porte recomenda-se distribuir pequenos aquecedores feitos de uma mistura de lascas de madeira com óleo diesel acondicionados em latas de óleo combustível ou óleo comestível de 1 litro, o que produzem bom aquecimento. Isso vale se a bacia for pequena e conseguir segurar a fumaça. A longo prazo, a instalação de quebra-ventos visa reduzir os impactos dos ventos frios e dos ventos dominantes durante o ano. Terrenos expostos a vento frio devem ter os renques de árvores cortando essa direção. Caso o interesse seja reduzir os efeitos dos ventos dominantes durante o ano, deve-se observar na propriedade a tendência de inclinação das árvores em decorrência do impacto contínuo do vento e instalar as cortinas perpendiculares a essa direção. Os ramos inferiores das árvores devem ser eliminados até pelo menos 1 metro acima das copas dos cafeeiros para permitir o escoamento do ar frio durante a noite.
Uma técnica que vem sedo muito utilizada para minimizar os impactos das geadas é a arborização com espécies arbustivas e arbóreas, sendo bastante eficiente. Tem sido utilizado, com bons resultados, o guandu na implantação da lavoura, a grevílea em todas as áreas ou a bracatinga nas áreas mais elevadas de solos argilosos. No caso do uso do guandu faz-se um túnel. O guandu comum ou guandu gigante é semeado na entrelinha em setembro/outubro e conduzido para formar um túnel alto sobre a linha de cafeeiros, que é plantado em fevereiro-março após um período chuvoso. Esse plantio faz com que se aumente a eficiência de pegamento, reduzindo a incidência de bicho-mineiro e ervas daninhas, além de proteger contra geada. O túnel deve ser gradativamente eliminado após o inverno.
As propriedades que geram grandes quantidades de resíduos vegetais (palhas) podem utilizar uma cobertura espessa sobre as mudas, que é retirada após passado o risco. Na impossibilidade dessas técnicas citadas, ainda existe a dobra de mudas de café com até 6 meses após o plantio no campo, recobrindo-as com uma camada espessa de terra (15 a 20cm) na véspera da ocorrência de geadas. Passado o alerta, as plantas devem ser descobertas manualmente e de imediato. Quando não é mais possível dobrar as mudas para cobrir, com altura maior que 20 cm, pode-se acumular terra junto aos troncos até a altura do primeiro par de ramos plagiotrópicos a fim de evitar a geada de canela e proteger as gemas contra as geadas mais severas. Assim, mesmo que a parte aérea venha a morrer, evitam-se prejuízos maiores com replantio, conduzindo-se a uma nova brotação, porém é uma operação de risco e com custo elevado, muitas vezes inviável.
Existe também o uso de materiais de cobertura ou de práticas que alterem o microclima e o balanço de radiação da cultural, como cobrir mudas com sacos de papel. Essas medidas podem ser de curto prazo, realizadas no ano da ocorrência de uma geada, ou de longo prazo, realizadas na instalação da cultura. No mais, a lavoura deve ser acompanhada minuciosamente pelos produtores e técnicos de campo para evitar ou reduzir o risco de geada, pois uma vez que atinge a lavoura, a reversão é pouco eficiente e nem sempre é possível de ser realizada. E mesmo as lavouras que aparentemente não foram prejudicadas podem ter as gemas lesionadas (José Donizeti Alves - GEADA 2021, ELA VOLTOU! COMO FOI? O QUE FAZER?), sendo uma porta abertas para entrada de pragas e doenças (Edson Pozza - GEADA - BAIXAS TEMPERATURAS FAVORECEM DOENÇAS ).
FONTE:
CARAMORI, P. H. et al. MÉTODOS DE PROTEÇÃO CONTRA GEADAS EM CAFEZAIS EM FORMAÇÃO.
CARVALHO, L. G.; DANTAS, A. A. A.; CASTRO NETO, P. Agrometeorologia: Geada e plantas cultivadas. Lavras, UFLA, 2014.
MATIELLO, J. B.; ALMEIDA, S.R. Deu geada no cafezal, não façam podas já. Engs Agrs Mapa-Procafé, REVISTA DO CAFÉ, 2016. 24p. Disponível em: link. Acessado em: junho 2017.
REHAGRO. Acesso em: Geada nos cafezais: Como evitar prejuízos na propriedade
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
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