O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
Ver mais
Não resta a menor dúvida sobre a importância das folhas para produção agrícola. Apesar disso, a seguinte questão, que ilustra o título dessa matéria, me foi formulada e serve para reafirmarmos aquilo que, segundo a nossa ótica, já deveria estar consolidado, mas não está. Vamos às explicações.
A carga de café que as lavouras comportam hoje, 26 de fevereiro de 2021, é reflexo do que aconteceu entre agosto e novembro e não há nenhuma contradição em relação ao enfolhamento atual da lavoura e o volume de café a ser colhido. Depois da forte seca e altas temperaturas no segundo semestre do ano passado, que deixaram as plantas desfolhadas, debilitadas, desnutridas e propensas a pragas e doenças, as chuvas retornaram a partir do final de novembro, as temperaturas ficaram mais amenas e as lavouras reagiram favoravelmente ao clima (especialmente aquelas que receberam os tratos culturais, ainda que tardiamente, entre dezembro e fevereiro), lançando novas folhas e se encontram hoje com vigor pleno. Entretanto, quando observamos a frutificação há uma aparente contradição entre o alto vigor vegetativo das plantas e a baixa carga de frutos, o que sucinta a dúvida que fundamenta esse artigo.
Dando um zoom na copa do cafeeiro, percebemos que na parte produtiva do ramo existem (i) nós sem frutos onde deveriam estar alojadas rosetas com frutos; (ii) rosetas banguelas, com quatro a cinco frutos onde deveriam existir de 12 a 18 frutos e (iii) rosetas com bastante frutos, mas de tamanho desuniforme. As duas primeiras desordens fisiológicas se devem à problemas no vingamento das flores, ao aborto dos frutos recém-formados e à queda de chumbinhos. Na prática, elas são resultado da seca e do calor desde a florada até a fixação do chumbinho. Finalmente, a desuniformidade no tamanho dos frutos se deve às diversas floradas e à competição entre eles na fase de expansão dos chumbinhos, em cuja regra os frutos das primeiras floradas se comportam como dreno mais fortes e vencem a competição com os frutos das floradas subsequentes.
Essa descrição do que aconteceu entre agosto e dezembro do ano passado, por conta do clima adverso, é o que levou a porção produtiva do ramo plagiotrópico abrigar nós sem frutos, rosetas banguelas e frutos de diversos tamanhos e resultará em quebra significativa na safra desse ano, o que nada tem a haver com o enfolhamento pós-novembro/2021, uma vez que o que se perdeu está perdido e não tem retorno. Talvez neste momento, em que ficou explicado a ausência da relação entre o enfolhamento atual da lavoura e carga de frutos que essa mesma lavoura comporta, é bom discorrer sobre algumas vantagens de uma lavoura enfolhada em relação àquela que não conseguiu se recuperar.
Resumidamente, as folhas são as responsáveis pela produção de energia que fará os atuais frutos crescerem em tamanho e em peso e fixar os frutos nos ramos, impedindo ou minimizando sua queda. Obviamente, tudo isso vai refletir positivamente na safra de 2021, impedindo que ela caia mais ainda. Além disso, se o clima continuar favorável, essas lavouras deverão lançar até o final do inverno aproximadamente dois nós extras por ramo produtivo, que irão florescer no segundo semestre desse ano e produzir no ano que vem, minimizando também a quebra de safra de 2022. Concluindo, ao estancar as perdas, as folhas irão favorecer as próximas duas safras caso o clima continue a colaborar.
Finalmente, é importante lembrar que nesse momento as duas sementes que existem em cada fruto estão se estruturando na chamada fase de granação. Isso quer dizer que os líquidos internos estão se solidificando e os grãos de café estão tomando a forma que conhecemos, e todo esse processo é altamente dependente de água e temperatura amena. Se durante toda a fase de granação faltar chuva e as temperaturas estiverem acima de 35°C é de se esperar um alto índice de grãos chochos, o que irá diminuir ainda mais a produção e a qualidade do café desse ano. Basta lembrar que, em fevereiro de 2014, as lavouras estavam na mesma situação que as atuais e, por conta da seca e do calor em fevereiro daquele ano, várias delas localizadas no Sul de Minas Gerais tiveram índices de até 45% de grãos chochos.
“A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas só pode ser vivida olhando-se para frente”. Está certo esse pensamento, pois é preciso ter esperanças no futuro. No entanto, nunca devemos esquecer que “aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la”.
No caso presente, não temos como dominar o clima, mas podemos nos antecipar e preparar nossas lavouras para enfrentar um possível veranico. A dica é aquela de sempre: irrigação, nutrição, controle de pragas, doenças e mato, etc etc etc. Para tanto, converse com o seu consultor. Se você, em 2014, se antecipou com sucesso aos problemas, repita tudo esse ano. Se não, não repita, pois você já conhece a história.
"Observar às lavouras hoje nada lembra aquele período entre os meses de setembro a novembro do ano passado, em que o calor excessivo e a falta de chuvas prejudicaram muito às plantas. Agora, mesmo com a recuperação do enfolhamento e bom desenvolvimento do cafeeiro, a produção foi penalizada para esta safra em muitos cafezais. Aqueles produtores que conseguiram realizar todos os tratos e cuidados da forma correta poderão minimizar os seus prejuízos através do bom desenvolvimento para a safra 2022", disse Guy.
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
Ver maisVer mais