O cafeeiro é resiliente aos estresses climáticos?
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Hoje, a realidade é totalmente diferente de pouco tempo atrás. Saímos de R$500,00 a saca para R$1.300,00 nos atuais, porém os custos também subiram muito, principalmente dos fertilizantes, que aumentaram proporcionalmente muito mais do que o café. A relação de troca piorou muito!
O clima trouxe a escassez do grão e está muito difícil produzir. Durante a safra que estamos colhendo em 2022, que começou em 2021, houveram situações climáticas adversas, como veranicos e altas temperaturas em janeiro, o que prejudicou o desenvolvimento de ramos e gerou menor número de internódios, baixas reservas de água no solo durante o período seco e agora, para completar, chuvas abaixo da média de meados de fevereiro para cá, segundo o Sismet da Cooxupé. O inverno de 2021 houve ocorrência de geadas como a muito tempo não se via. Durante a florada, em outubro, também tivemos chuvas excessivas. Ainda sobre as geadas, no ano passado, enquanto avaliava lavouras para definir estratégias de poda, fui alertado pelo produtor Sr. Márcio Lattarini, meu assistido de Santo Antônio do Jardim/SP, na região de Pinhal, que já acompanhou diversas geadas desde 1955 e conhece bem o assunto, para a questão do dano invisível causado pela massa de ar gelada, o que poderia comprometer inclusive lavouras que não tiveram queima aparente, prejudicando assim as gemas reprodutivas e, por consequência, gerando rosetas mais ralas.
Na época, recorri ao Prof. José Donizeti Alves, que me explicou que o ar frio afeta os tecidos mais tenros, como as gemas reprodutivas. O fenômeno afeta a capacidade de florescimento das plantas, interferindo assim na sua capacidade de reprodução. E é isso que, infelizmente, estamos constatando hoje em muitas lavouras, colhendo de 20 a 40% menos do que a expectativa para essa safra, principalmente em lavouras mais velhas que produziram ano passado. Já nas lavouras que vieram de poda, o impacto é menor.
Meu tema aqui no Especialista é planejamento para a safra 2023 e não posso deixar de mencionar o que estamos passando. Tenho repetido com frequência que produzir café não é para amadores, por isso precisamos tirar lições desta nova realidade de custos altos e baixas produtividades. Vou abordar alguns pontos que não podem ficar fora do planejamento:
1º ponto: Uso racional dos fertilizantes
Mesmo com aumento do valor da saca de café, também estamos vivendo um período de aumento dos custos de produção, principalmente dos insumos atrelados ao dólar, por isso é importante que o produtor realize uma análise de solo para entender quais elementos estão presentes e em que quantidade. Depois disso, juntamente com seu agrônomo, o cafeicultor deve pensar em quais produtos comprar, além de outras alternativas para oferecer nutrição adequada às plantas, como utilização de insumos produzidos na propriedade e realização de correção da acidez do solo.
• Insumos produzidos na própria Fazenda:
Oriundos de resíduos da produção, eles podem ser fonte de nutrição para as plantas e ainda economia para o produtor.
- Utilizar palha de café, que possui cerca de 3% de potássio: a palha pode ser utilizada pura, porém o ideal é que passe pelo processo de compostagem controlada em mistura com outros materiais, como esterco disponível na região e pós de rocha;
- Correto manejo de ervas daninhas para aumentar a matéria orgânica no solo, reduzindo assim a necessidade de nitrogênio.
• Correção da acidez do solo:
Esse procedimento tem como objetivo aumentar a sua fertilidade através da aplicação de corretivos (calcário e gesso) ao solo para o desenvolvimento saudável das plantas. Além disso, permite diminuir a presença de pragas e doenças, aumentando a produtividade da lavoura.
A calagem promove importante modificação no ambiente radicular, pois diminui a acidez do solo, fornece Ca e Mg e aumenta a disponibilidade e eficiência na utilização de vários nutrientes. O cálcio fortalece o sistema radicular das plantas e ainda melhora as propriedades físicas do solo, já o magnésio é um nutriente fundamental para as plantas, especialmente na fotossíntese. Além disso, com a acidez do solo corrigida, os fertilizantes que serão aplicados terão uma melhor eficiência, o que consequentemente tem impacto na produtividade.
No momento, mais importante do que pagar mais caro ou mais barato nos fertilizantes é utilizar os conhecimentos agronômicos e as ferramentas que o cafeicultor tem à disposição, como análise se solo e folhas, utilizar os resíduos oriundos da própria atividade, realizar o manejo de mato para melhorar o solo, entre outros. É esse uso racional que nos ajudará a enfrentar esse momento difícil.
2º ponto: Manejo de mato - Cultura de cobertura
O plantio da cultura de cobertura é essencial para manter o solo vivo. Os principais benefícios da sua utilização são: controle da erosão do solo, cobertura e proteção, aumento no teor de matéria orgânica, reciclagem e fornecimento de nutrientes, incremento na infiltração de água no solo, aumento de biodiversidade, melhorias na produtividade e menor risco de ocorrência de pragas e doenças.
A braquiária é umas das opções mais utilizadas pelos produtores que utilizam essa técnica, mas também é possível utilizar um consórcio de plantas, os chamados mix, em que 2 a 4 ou até 6 ou 10 plantas de diferentes espécies e/ou famílias são semeadas simultaneamente para proporcionar uma maior biodiversidade, contribuindo para um maior equilíbrio ambiental com resultados favoráveis ao solo e ao cafeeiro.
Dica: é importante acompanhar a disponibilidade de água no solo e intervir com roçadas na época de seca e em caso de longos veranicos, além de manter limpa uma boa faixa na linha das plantas através da aplicação de herbicida pré-emergente, evitando assim que ocorra competição com o cafeeiro.
3º ponto: Podas
Essa técnica é realizada com o intuito de rejuvenescer as plantas. Plantas podadas perdem menos energia e conseguem passar mais facilmente por momentos adversos, como seca e temperatura elevada. O cafeeiro deve ser mantido sempre jovem, pois dessa forma consegue produzir e crescer para a safra seguinte. Há diversos tipos de podas para várias situações, e a adoção do sistema correto depende de uma criteriosa avaliação antes de sua execução.
Dica: se a produtividade for baixa, o ideal é zerar a lavoura para que as plantas precisem apenas desenvolver a vegetação para a safra seguinte.
4º ponto: Renovação de lavouras
A poda não muda o sistema de produção em que a lavoura está inserida, que poderá continuar limitada por ele e também pelas características da cultivar ali plantada, por isso vale a pena analisar se não é o caso de realizar o replantio no local utilizando um sistema mais moderno, com cultivares mais adequadas, resistentes a pragas e doenças e de maior potencial de produtividade.
Observamos nos diversos campos que alguns materiais são mais resistentes a altas temperaturas quando comparado com outros na mesma condição, daí a importância de conhecer o comportamento da variedade na região e levar essa característica em consideração no momento da escolha da variedade a ser plantada. Além disso, é importante fazer o planejamento antecipado do plantio através do levantamento planialtimétrico do local para favorecer a mecanização, principalmente da colheita.
5º ponto: Irrigação
Essa técnica de mitigação da falta de chuva em momentos cruciais para o cafeeiro não serve para todos os cafeicultores, porém, para os que possuem os recursos necessários, os resultados são grandes independente da região produtora.
O estresse hídrico por falta de água pode levar à queda de produtividade, embora seus efeitos dependam da duração, intensidade e estádio fenológico em que a planta se encontra. Nos estádios fenológicos de vegetação, formação do grão e maturação, uma deficiência hídrica severa pode afetar a produtividade.
E aqui fica uma dica: para não ter problemas com a implantação e uso do sistema de irrigação, o cafeicultor deve procurar técnicos e empresas realmente competentes com relação ao planejamento, montagem e execução do projeto.
6º ponto: Controles fitossanitários
E para finalizar, gostaria de falar sobre planejamento dos controles fitossanitários. Hoje, já temos uma visão diferente do manejo de pragas e doenças e sabemos que também é importante conhecer e monitorar não só as pragas, mas também seus inimigos naturais - MOB. Para isso, é necessário:
• Capacitação dos funcionários e técnicos sobre as pragas e seus inimigos naturais;
• Monitorar regularmente e acompanhar o que acontece naturalmente na lavoura, pois muitas vezes descarta-se a necessidade de outras intervenções se houver equilíbrio entre as pragas e seus inimigos naturais, o que permite a adoção de ações mais assertivas no manejo.
Sobre pragas e doenças:
• Ferrugem
É sem dúvida o principal problema fitossanitário, pois ocorre todos os anos e em todas as regiões produtoras do país. A maioria das variedades utilizadas hoje são susceptíveis à doença, que causa redução da área foliar, reduzindo o potencial de produção do ano seguinte. As perdas em produtividade podem superar 30% ao longo de várias safras. Seu controle pode ser com o uso do defensivo via solo e via folha.
• Broca
Este ano, a broca está mostrando altas infestações em algumas glebas. Sua ocorrência depende das condições climáticas e da quantidade de grãos remanescentes da safra anterior, e os prejuízos causados são muito significativos, tanto na qualidade como no valor do café, uma vez que o furo causado pela broca no grão ainda pode facilitar a entrada de bactérias e fungos no interior do fruto. Uma colheita bem-feita, monitoramento e aplicação dos defensivos adequados na hora certa são ações fundamentais para não ter prejuízos.
• Bicho Mineiro
O bicho-mineiro é a principal praga em muitas regiões. Dependendo da intensidade, duração do ataque e a época de ocorrência, pode reduzir a capacidade produtiva do cafeeiro de 50% a 80%, com consequente redução na produção de café na safra seguinte. É terrível e o clima seco favorece sua ocorrência. O controle pode ser feito com via solo junto com a ferrugem e sempre que necessário complementar com defensivos via folha de acordo com monitoramento.
Dica: O cafeicultor deve atentar para a rotação de ingredientes ativos, evitando assim a perda de eficiência das moléculas.
A presença de estrelinhas nas lavouras de café é um aviso, uma resposta das plantas ao clima adverso de que algo está fugindo da normalidade
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